O tema é instigante, pois são muitos os desafios a serem vencidos para o fomento da indústria e a recuperação de seu vigor, já no contexto da chamada Manufatura Avançada, permeada pela descarbonização, transformação digital, inteligência artificial generativa, realidade aumentada e virtual, internet das coisas e todas as tecnologias revolucionárias do nosso tempo. Um período da história que é tão disruptivo.
Para falar do futuro e melhor entender os caminhos a serem percorridos, é necessário recordar um pouco do passado.
A partir da década de 1950, a indústria de transformação teve um novo impulso no Brasil, chegando a representar 25% do PIB nacional. Porém, retrocedeu nas últimas quatro décadas. Foi, e tem sido premida por problemas como o “Custo Brasil”, dificuldades de crédito e investimento, insegurança jurídica, ciclos longos de juros elevados, desequilíbrio fiscal e falta de políticas de longo prazo para seu fomento – de Estado, não de governos.
O setor, portanto, encolheu e perdeu competitividade. Responde, hoje, por cerca de 11% do PIB, embora arque com aproximadamente 30% do total de tributos. E isso estranhamente não retrocedeu, em um claro e irresponsável desequilíbrio. O peso dos impostos e dos demais fatores que citei penalizam uma atividade que demanda altos investimentos em tecnologia, máquinas, equipamentos e capital humano, com necessária e urgente mudança de “mindset”.
Esperamos que a Reforma Tributária corrija tal distorção. Nesse cenário, preocupa-nos assistir à inclusão de tantas exceções no projeto de lei de sua regulamentação, ora em curso no Congresso Nacional. Os desnecessários benefícios e isenções, já introduzidos, levarão à uma alíquota padrão em torno de 26,5%. Será o segundo maior imposto de valor agregado do mundo, atrás apenas da Hungria. É preciso rever urgente essa questão no Legislativo Federal.
Além dos problemas macro que, como já disse, são muito nocivos à uma atividade que exige pesado e constante aporte de capital, a indústria é brutalmente atingida por medidas pontuais, não menos contundentes. Uma delas, objeto de surpresas diárias, é a novela da desoneração da folha de pagamentos de 17 setores intensivos em mão de obra. A incerteza persiste. Por isso, as empresas sequer conseguem planejar o fluxo de caixa para o curto prazo.
Outro fator foi a irresponsável isenção, em agosto de 2023, dos impostos para encomendas de até 50 dólares das plataformas internacionais de e-commerce. Agora, após uma infinita batalha, foram taxadas somente em 20% mais um ICMS que é inferior ao que pagam muitos estados. Ou seja: ainda sofremos uma absurda concorrência desleal em relação à totalidade de tributos pagos pelas empresas brasileiras, em injusto e absurdo benefício às empresas estrangeiras.
Lembro, ainda, outras duas decisões igualmente lesivas à indústria e à economia do Brasil: a tributação das subvenções para investimento e custeio (incentivos de ICMS), que acarreta perdas estimadas em R$ 25,9 bi; bem como a limitação temporal ao aproveitamento de créditos tributários federais decorrentes de decisão judicial, com perdas estimadas em R$ 24 bilhões.
São medidas duras, que se somam a um ambiente macroeconômico já complexo, atingindo mais uma vez a indústria.
Diante da inquietante realidade, exigem-se amplas estratégias, mas, acima de tudo, inteligência, bom senso, vontade política e urgência para que vislumbremos um futuro mais promissor e que reverta o êxodo de nossos talentosos jovens, que abandonam nosso País em busca de oportunidades no exterior.
Também é preciso ajustar as alíquotas da reforma tributária e realizar a administrativa, que segue dormente, mas que é decisiva para melhorar o desempenho e o custeio de um Estado inchado e ineficiente, equacionando com responsabilidade a questão do orçamento público.
Cabe equalizar, em definitivo, as políticas fiscal e monetária, reduzindo-se os juros e o “spread”. É imprescindível, por fim, um olhar mais amplo e bom senso na adoção de medidas que oneram a indústria, avaliando-se os imensos danos que podem causar ao longo de sua cadeia produtiva geradora de milhões de empregos.
Todos os problemas, macro e pontuais, aqui abordados, afetam e reduzem os efeitos positivos do plano da Depreciação Acelerada, que favorece investimentos em modernização, como também do programa Nova Indústria Brasil, que prevê financiamentos de 300 bilhões de reais até 2026. São políticas públicas que as entidades representativas do setor têm proposto e defendido com ênfase, porque seu êxito é crucial.
Seguimos, unidos e mobilizados na viabilização das soluções. São complexas, é verdade, mas exequíveis e capazes de encontrarmos caminhos para uma concreta nova reindustrialização do Brasil.
A educação, o contínuo aprimoramento do conhecimento, as mudanças de “mindset”, o desenvolvimento de materiais avançados, o trabalho em rede, o reposicionamento das cadeias globais e regionais de fornecimento, a modernização, os ganhos de produtividade e o desenvolvimento sustentável, através de uma economia circular, são fatores determinantes para impulsionar efetivos avanços, deixarmos de andar de lado e ascendermos ao patamar das nações de alta renda!
Porque só com uma indústria forte, teremos um País forte!
Rafael Cervone
Presidente do CIESP
*Rafael Cervone é o presidente do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp) e primeiro vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).